O desafio
Em muitas escolas, a presidência e o cargo de tesoureira(o) do Conselho Escolar, responsável pela gestão dos recursos, são ocupados pela(o) diretora(or). Essa situação gera, em algumas comunidades escolares, descontentamento, incômodos e ruídos de comunicação sobre a legitimidade e transparência do uso dos recursos, criando um ambiente desfavorável à gestão democrática.
O gestor dessa escola mudou esse paradigma. Ele expressou seu desejo de delegar essas responsabilidades para outras(os) participantes, mudando o sentido do Conselho Escolar para uma abordagem mais colaborativa e participativa. Sua postura, inicialmente, gerou estranhamento, porque quebrava uma tradição na escola, situação que precisou ser superada na nova fase da gestão.
Foram necessárias ações de convencimento para que todas(os) percebessem o benefício dessa mudança para a aprendizagem das(os) estudantes, porque a decisão do uso dos recursos partiria do Conselho Escolar e não só do diretor.
A escola que inspirou a prática
- Escola Municipal de Ensino Fundamental Araci Correa Santa Maria
- Ensino Fundamental I – 1º ao 5º ano
- Escola urbana com 290 estudantes e 10 docentes
- Ano de referência – 2023
- Município de Bagre (PA)
Esta prática foi inspirada na entrevista com José Oérico sobre sua experiência em gestão escolar. Agradecemos o José por compartilhar conosco iniciativas realizadas para a melhoria da aprendizagem.
A solução
Na eleição do Conselho Escolar, ficou estabelecido que para os cargos de presidente e de tesoureira(o), o diretor não seria elegível. Dessa forma, com a ampliação da participação das famílias e demais membros da comunidade, também nesses cargos, foi possível traçar uma educação mais qualificada e com equidade, já que as decisões sobre o uso de recursos priorizaram a aprendizagem de todas(os). A iniciativa também se configurou como um bom exemplo para estudantes sobre o significado da participação democrática.
Principais resultados
- A priorização dos recursos, discutida por todas(os) do Conselho Escolar, possibilitou decisões mais assertivas, maior envolvimento de toda a comunidade e foi associada a avanços na aprendizagem, observados nos resultados do Ideb. Em 2021, a escola obteve a melhor nota de avaliação do município, levando a cidade ao 3º lugar entre os 17 municípios da Ilha de Marajó.
- Maior credibilidade por parte da comunidade escolar no que se refere aos gastos dos recursos disponíveis.
- Maior aproximação entre equipe gestora, docentes, funcionárias(os), famílias e estudantes.
- O gestor ganhou mais tempo e condições para se dedicar à área pedagógica.
Passo a passo para administrar recursos com participação da comunidade escolar
Preparação para estabelecer uma administração democrática
- Converse com a equipe gestora para que se tenha clareza de que a(o) diretora(or) não ser a(o) presidente e tesoureira(o) no Conselho Escolar não a(o) isenta da tomada de decisão, mas significa dividir responsabilidades.
- Embora a(o) diretora(or) não exerça a função de presidente ou de tesoureira(o) no Conselho Escolar, ela(e) possui uma visão ampliada das necessidades da escola e, portanto, tem o papel de fazer ponderações e de apontar as prioridades. Por exemplo: se o bebedouro da escola apresenta problema, essa necessidade não entra em discussão, mas deve ser prioridade.
- Reúna docentes e funcionárias(os) para expor essa ideia de que os cargos de maior responsabilidade no Conselho Escolar (presidência e financeiro) não serão assumidos pela(o) diretora(or) para se estabelecer uma gestão democrática, reforçando que a(o) diretora(or) participa ativamente do Conselho Escolar.
- Apresente na reunião com cada grupo, no início do ano, o recurso disponível para a realização das prioridades escolares, cujo uso deve focar a qualidade da aprendizagem. Há recursos com destinação prévia e só podem ser utilizados para determinados fins. Mesmo que a escola disponha de alguma verba em caixa, nem sempre poderá ser utilizada em uma demanda apontada pela comunidade escolar.
- Utilize o momento com os diferentes grupos para discutir as necessidades da escola para melhorar a aprendizagem, sempre por meio das lentes da equidade (veja sobre marcadores sociais de desigualdade aqui). Veja, também, como integrar equidade às políticas públicas, clicando aqui. Faça perguntas como: “realizar essa sugestão trará quais benefícios para a aprendizagem?”, “como vocês imaginam o passo a passo para que essa demanda seja efetivada?”, “há grupos de estudantes que possuem necessidades específicas?”.
- Organize eventos, como festa junina, piqueniques e palestras, para arrecadar fundos e contar com a contribuição de toda a comunidade escolar. O que for arrecadado pode ser utilizado para urgências ou para manter o fluxo de caixa, focando sempre a aprendizagem.
Implementação de ações para estabelecer uma administração democrática
- Exponha, na primeira reunião do Conselho no ano letivo, os recursos existentes no caixa da escola e os que são disponibilizados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e pelo Programa Dinheiro Direto na Escola, ambos do governo federal, para fazer a melhor gestão desses recursos.
- Defina a periodicidade dos encontros do Conselho Escolar para discutir as sugestões levantadas nos grupos sobre o uso de recursos (pode ser a cada três meses).
- Estabeleça metas (resolver a questão até mês “x”) e prazos para cada fase do processo (reunir-se com fornecedores até dia “x”, definir orçamento até dia “y”).
- Leve a lista de demandas prioritárias às reuniões do Conselho para o ano letivo. A depender da complexidade, como a construção de um estádio poliesportivo, a periodicidade da meta pode ser definida para o ano seguinte ou até o fim do mandato do Conselho, em geral de dois anos.
- Compartilhe as decisões das reuniões (ações e prazos) com toda a comunidade, por meio de cartazes, mensagens em grupos de WhatsApp, no site da escola, carta às famílias etc.
- Oriente sobre a distribuição dos recursos. Exemplo: 40% devem ser usados para manter o caixa e 60% para manutenção e melhorias na escola.
Monitoramento das ações e transparência
- Publique mensalmente a prestação de contas, para demonstrar uma gestão transparente. Use o mural da escola, o site e outros canais de comunicação com a comunidade escolar.
- Inclua no planejamento anual do recurso recebido pela escola uma revisão no meio do ano, para monitoramento e avaliação do desembolso e das ações priorizadas. Caso necessário, convoque uma nova reunião do Conselho Escolar para ajustes de rota.
A equidade na rotina da escola
- A gestão democrática promoveu a transparência, a inclusão e o respeito pelas opiniões de todas(os) as(os) envolvidas(os). Os processos decisórios foram realizados de forma colaborativa, por meio de reuniões, assembleias e conselhos, em que ideias foram discutidas e votadas democraticamente. A participação em órgãos colegiados para alocação de recursos financeiros pela lente da equidade tem o potencial de ser, além de transparente, eficiente, responsiva e equitativa.
- Crie um espaço de escuta com cada grupo da comunidade escolar (professoras/es, famílias, funcionárias/os e estudantes), para que se estabeleçam o diálogo e a exposição de ideias sobre uso de recursos, que devem ser levadas à reunião do Conselho Escolar.
Desafios enfrentados
- Nenhum membro do Conselho Escolar querer assumir o cargo de presidente e/ou tesoureira(o) por livre e espontânea vontade.
- Grande necessidade de argumentação para convencer o Conselho Escolar a escolher outras pessoas para assumirem o cargo de presidente e tesoureira(o), que não fosse o diretor da unidade escolar.
Materiais de referência
- Equidade nas políticas públicas (clique aqui e saiba mais)
- Marcadores de desigualdade educacional (clique aqui e saiba mais)
- Matriz de práticas do Centro Lemann (clique aqui e saiba mais)
Comunidade escolar envolvida
- Estudantes
- Docentes
- Liderança escolar
- Famílias
- Demais funcionárias(os) da escola
Para saber mais
Esta prática contribui para a gestão de processos e recursos, pois planeja seus gastos com a participação de órgãos colegiados e aloca seus recursos financeiros de maneira transparente, eficiente, priorizando investimentos que potencializam a aprendizagem e o desenvolvimento integral de estudantes em situação de vulnerabilidade, com vistas a reduzir as desigualdades intraescolares (clique e saiba mais).